sábado, 13 de abril de 2013

A Vida de David Gale - Final





Meu objetivo neste post é desconstruir a verdade de David Gale, não para impor a minha, estejam livres para desconstruí-la se quiserem. Não existe a minha verdade, aliás, uma questão que me vem à cabeça é: será que Alan Parker, ao construir esse enredo teve consciência de todos os vieses do seu personagem? Será que ele acreditava que construia um personagem que lutava por um ideal e não pela sua própria honra? Será?


Bitsy, cada vez mais envolvida com o drama do professor, começa a querer provar sua inocência a tempo de salvá-lo, ela não sabia que sua intenção com a entrevista não era essa. Desesperada ela aposta suas fichas na culpa de Dusty, começa ela a persegui-lo e descobre que era ele quem lhe deixava as fitas. Enquanto isto, Gale, cultivava um ar de certa satisfação pela sua situação, narrava sua vida à repórter com um tom melodramático, para que Bitsy se sensibilizasse pelo fato e reproduzisse posteriormente os seus objetivos.


A esta altura o filme mostra a movimentação popular em torno do fato, uns sedentos pela morte do professor, sem o menor juízo do fato, outros protestando contra a pena de morte, tais quais como os primeiros. Bitsy entre todos, era quem possuia alguma informação sobre o assunto, mesmo assim, sua emoção não a deixou racionalizar o fato, e sua luta pela absolvição do professor – justa, já que de fato David Gale era "inocente", embora cúmplice do suicídio da amiga – passou a ser a sua meta principal.  


Assim a repórter se tornou um fantoche nas mãos de Gale, fazendo passo a passo exatamente o que ele queria que ela fizesse, e sentindo o que ele queria que ela sentisse. Não só ela como todos nós.  Imaginemos como essa personagem “sofreu” tentando salvar o professor da morte, tentando montar o quebra-cabeça. Agora, quão frio foi David Gale, ao manipular a jornalista só por causa dos seus brios. No momento que assisti ao filme não pensei nisto, a ideia me pareceu genial, afinal ele era o inocente que morreria pelo sistema.



Porém, David não foi condenado sem provas, ele gerou as provas. Gale e Constance transaram antes de sua morte, logo havia sêmen do acusado na vítima, além dos agravantes mencionados, que era o seu artigo sobre o tipo de morte, mais seus antecedentes com Berlin. Quantos que supostamente morreram inocentes, como afirmava o professor, deixaram tais provas na cena do crime? Na verdade tudo que ele não fez foi assassiná-la com as próprias mãos, o resto foi um ardil sórdido. Ambos aplicaram a pena de morte a si próprios, para provar que a pena de morte não era justa.



Repleto de paradoxos, o enredo chega ao fim, enquanto Bitsy corre feito uma louca para chegar a tempo no local da execução, Gale vai com um semblante sarcástico para seu banho antes da hora final. Para amarrar a ideia de que o protagonista era um herói, é mostrado que o dinheiro recebido pela entrevista foi destinado à seu filho. Que pai atencioso! Ele queria mostrar para seu filho que ele, e nada além dele, era um bom homem.




Quando Bitsy chega ao local, já era tarde, o povo já comemorava e outros lamentavam sua morte. A prova que ela tinha até então era parte da fita que mostrava a morte da professora. Frustrada a repórter chorou. Choraria mais ainda quando depois de limpar a imagem de David Gale perante a sociedade, ao publicar a matéria com sua vida, ela receberia a fita integral da morte, desde o início, onde aparecia a professora instalando a câmera, fazendo sozinha todos os passos de sua tortura, em seguida Dusty indo confirmar sua morte, e por fim o próprio David Gale aparece em cena, para mostrar que ele sabia de tudo e forjou tudo aquilo de que ela achava que ele estava sendo acusado injustamente.   




Talvez, se Bitsy tivesse tido acesso a fita integral antes de sua execução, ela mesmo iria matá-lo, só de raiva. Ele não era inocente, a justiça agiu correto, pois havia as provas, e ele era culpado pelos atos praticados, ele aceitou friamente a morte de sua melhor amiga, para limpar sua honra. Pouco importa se ambos estavam sem perspectivas de vida, eles se mataram sem culpa por crime algum a priori. Não apareceu o interesse pela causa, apenas por ele próprio. Gale se colocou naquela situação, a ordem dos fatores, para mim, não altera o produto.




O filme falava ou não APENAS da vida de David Gale?

A Vida de David Gale - Parte II





A vida de David Gale é um filme envolvente, nos vemos torcendo pelos personagens, criticando aqueles que se voltaram contra o protagonista, nos sentimos solidários ao drama do professor. Após demonstrar os aparentes porquês da história, o enredo toma outro rumo, colocando em evidência a jornalista Elizabeth “Bitsy” Bloom (Kate Winslet), a pessoa que David Gale escolhe para dar uma entrevista nos seus 4 derradeiros dias de vida.


Até então, pouco se sabe sobre os reais motivos de sua prisão e condenação, a não ser o fato de ele ter sido acusado pelo estupro e suposto assassinato de sua amiga Constance. Por já ter em seu histórico um antecedente de estupro, e por já ter escrito um artigo sobre um tipo de morte, onde a vítima é forçada a engolir a chave das algemas que prendem suas mãos atrás das costas, é amordaçada, e em sua cabeça é colocado um saco para morrer por asfixia, isto foi suficiente para Gale ser apontado como principal culpado pela morte de Constance.



Bitsy, junto com os espectadores, começa a conhecer aos poucos o desenrolar da história narrada pelo próprio professor, já na prisão. Ele afirma ser inocente quanto à morte da amiga, como, igualmente, foi inocente no caso de Berlin. A jornalista no início foi entrevistá-lo certa de sua culpa, tal como toda a sociedade já o havia pré-julgado. No entanto, David vai lhe dando instrumentos para compreender os fatos, e aplicar o devido juízo ao caso – ou, ao menos o juízo que ele queria que fosse aplicado.


Surge então, um personagem coadjuvante: Dusty Wright (Matt Craven), um cowboy amigo dos professores, cuja presença só tem o intuito de nos induzir a pensar que seja ele o responsável pela morte de Constance. O mesmo passa a aparecer em todas as cenas onde estão Bitsy e o estagiário Zack Stemmons (Gabriel Mann), ele os persegue notoriamente. A jornalista logo fareja algo errado com o misterioso sujeito e passa a observá-lo.


Dusty, na verdade é o pombo correio externo de David Gale, por meio do qual o professor vai aos poucos entregando as provas do “crime” à Bitsy e Zack. Como as fitas de vídeo com o momento da morte da professora, vídeo este que foi repassado por capítulos à jornalista, para que não excedesse os 4 dias que ele tinha para ser executado. Gale não queria ser libertado.


Aqui chega a ideia real do filme. Até onde o egocentrismo leva uma pessoa? Lá no início do filme, seu argumento sobre a falibilidade do sistema prisional fora rejeitado, em rede nacional, pelo governador do Texas, justamente porque ele não tinha provas. Depois ele sofreu diversas outras rejeições por conta da acusação de sua ex-aluna, ele não admitiria ser refém, sem que a sua verdade prevalecesse.


Assim Gale forjou toda esta última situação. Constance se viu vítima de leucemia, não tinha perspectivas de vida, pelo menos com qualidade. Juntos eles tramam suas mortes pela causa que acreditavam; a professora aceitou se matar, sabendo que Gale seria incriminado, e este aceitou morrer só para provar que inocentes eram condenados a morte.  Dusty seria o sobrevivente que revelaria a verdade de David Gale à Bitsy, que por sua vez a revelaria ao país.




A Vida de David Gale - Parte I






A vida de David Gale é um filme brilhante. Muito bem construído, o enredo tende a levar os espectadores ao objetivo principal: crer que se trata de uma reflexão sobre a pena de morte. No entanto, após um longo estudo sobre o filme, debates, análises, apresentações e feedbacks, a conclusão é que se trata apenas da história da vida de David Gale mesmo.


Como assim? O filme não fala da luta de David Gale contra a pena de morte? Na minha mais singela opinião, não. Veremos.


O filme começa mostrando o perfil do professor de Filosofia, daqueles que se destacam dos demais professores, e por isso mesmo polêmico. A princípio, este destaque parecia algo positivo, tirando o personagem da mediocridade, do faça o que tem que ser feito e nada mais. Na verdade, esta característica foi o viés que permitiu o desenrolar de toda a trama.




Realmente, Gale (Kevin Spacey) pertencia a um grupo de ativistas que se colocavam contra a pena de morte, afirmando com veemência que inocentes eram condenados à morte. O que não fala no filme e em nenhum lugar é onde estão as provas que fundamentam este argumento? Acaso estes ativistas fizeram parte das investigações? O que o comportamento de Gale dá a entender é que prisioneiros eram condenados sem um maior cuidado quanto à investigação dos fatos.


Isso é irônico, pois Gale, sob a sua perspectiva, não precisava de provas, para mostrar que inocentes eram condenados sem provas. Vemos aqui a distorção dos fatos, em função da personalidade (ou ego) de um sujeito. Por ser um professor renomado, o mesmo exercia influencia sobre uma gama de Maria-vai-com-as-outras, que proclamavam a mesma opinião, sem conhecer os fundamentos. Incluo aqui sua amiga e professora Constance (Laura Linney).


Constance e David Gale
Para dramatizar o enredo, o autor coloca uma discussão clássica no que diz respeito a professores: o assédio de uma aluna. Entra em cena Berlin (Rhona Mitra), que, com a personalidade semelhante a do professor, o assedia para receber uma nota, e ao ser repudiada ela decide montar uma armadilha contra Gale.


Após ser expulsa da universidade, Berlin vai até uma festa onde o professor alcoólatra estava, e sensualmente o seduz no banheiro, conduzindo o sexo de forma violenta de modo a caracterizar um estupro, conforme o planejado. Assim o ego ferido da aluna vai ferir cruelmente o ego exaltado do professor. Berlim o acusa de estupro, e tal crime era passível de pena de morte no Texas. Enfim Gale era realmente uma vítima inocente do sistema.






Em seguida, o filme mostra o personagem há 4 dias de sua execução, no entanto, o crime era outro. A aluna havia retirado a queixa, e o caso foi arquivado. O prato cheio do professor para comprovar seus argumentos fora retirado, ali ele poderia ser desmentido, ou seja, as investigações poderiam comprovar que ele era inocente, ou ele seria morto como um herói, (ao menos em sua consciência), pois seria uma vítima da tese que defendia.


A simples acusação destruiu a reputação de Gale. Estupro ou não, um professor transou com uma aluna, se universitária, portanto, maior de idade. Logo, um homem e uma mulher. Sem entrar no mérito da questão, Gale, com sua moral manchada, viu sua vida social e sua liberdade e influência prejudicada, suas opiniões não estavam sendo consideradas. Seu ego estava em colapso. Após perder a família, o emprego de professor, o respeito dos colegas ativistas, a admiração de seus alunos, e se entregar ao alcoolismo, seu egocentrismo tem enfim um insight.







Epístola




A quem ler:

Sabe, a vida seria trágica se não fosse cômica. Embora mesmo cômica me rendeu certos mares de lágrimas...
 A raça humana é tão duvidosa, que mesmo eles desconfiam de si, e criaram registros de papel pra provar que de fato existe, tudo que eles criam. Até mesmo eu, não fosse um pedaço de papel comprovando, talvez fosse uma miragem.
É compreensível. Certas palavras num papel em branco revelam muito sobre uma pessoa. Talvez seja por isso que escrevo tanto; vou tentando a cada palavra, revelar algo sobre mim que nem uma autópsia descobriria!
Um papel escrito é algo palpável sobre o que ninguém vê, e há os que mesmo com esse registro não conseguem enxergar... E vou escrevendo compulsivamente, deixando meu legado.  Já que hoje ninguém me conhece, fica a prova de que eu existi pra posteridade.